Em entrevista ao portal O Economista, o vice-presidente do Cofecon, Luiz Alberto de Souza Aranha Machado, afirma que cenário econômico brasileiro é bom para quem quer exercer a profissão de economista, apesar dos desafios sociais e estruturais a serem superados no país.

Faltando pouco mais de um ano para a Copa do Mundo no Brasil, o país vive um bom momento para aqueles que querem seguir a profissão de economista. É o que acredita o vice-presidente do Conselho Federal de Economia (Cofecon), Luiz Alberto de Souza Aranha Machado. Graduado pela Universidade Mackenzie, especialista em Desenvolvimento Latino Americano pela Boston University, Criatividade pela Creative Education Foundation, Aprendizagem Acelerada pela International Alliance for Learning e em Tecnologia Educacional pela FAAP (Fundação Armando Álvares Penteado), Machado também é membro do Conselho do Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial e do Conselho Superior da Ordem dos Economistas.

Segundo ele, a estabilização da economia nacional, os eventos internacionais que vêm para o país e a atração que o Brasil ainda exerce internacionalmente “torna o cenário muito favorável para quem está se formando”. Na entrevista concedida ao portal O Economista, ele fala ainda sobre ensino de economia na formação escolar, sobre o endividamento das famílias e a relação do brasileiro com a economia: “Essa garotada que está chegando hoje na maioridade já cresceu com a estabilidade, então eles não têm o mesmo tipo de preocupação que aquela geração [passada] teve”, acredita.

E – Na entrevista com o colunista do Estadão, José Paulo Kupfer, ele nos disse que o brasileiro aprendeu a fazer conta por necessidade, principalmente nas épocas de grandes transformações econômicas, como no tempo de promessas de crescimento na ditadura, o Plano Collor, as trocas de moedas. Com isso, é possível afirmar que o brasileiro entende de economia? Será que um dia o brasileiro se preocupou com o assunto e essa nova geração, em contrapartida, está mais desatenta a isso?

Luiz Alberto – Não tenho dúvida. Naquele período não tinha muita escolha. Eu lembro de um artigo que eu escrevi no começo dos anos 80, Open, Over e Otras Cositas Mas, e que eu fiquei impressionado: eu tinha ido a um casamento e ouvi a conversa de um garçom com um tirador de chopp –  os caras estavam discutindo o que fazer com o salário. Um sugerindo que podia indicar para o outro onde poderia aplicar, porque tinha um frequentador daquele restaurante que era dono de uma corretora e eu fiquei impressionadíssimo, porque pessoas de um padrão relativamente modesto falavam desse assunto com bastante conhecimento de causa, o que me fez ver que era uma necessidade. Não era um luxo, uma escolha. Quem não fizesse isso perdia muito dinheiro. Então, realmente, naquela época os brasileiros acabaram se importando, buscando informação, no dia a dia estavam atentos ao que acontecia. Acho que isso hoje não ocorre porque essa garotada que está chegando na maioridade já cresceu com a estabilidade, então eles não têm o mesmo tipo de preocupação que aquela geração teve.

E – Então você acredita que a economia deveria ser uma disciplina básica, de ensino fundamental, médio. Seria uma forma de mostrar a importância da profissão, a necessidade de se investir neste tipo de educação atualmente?

L.A – Claro que eu adoraria que fosse assim, mas eu tenho sérias dúvidas. Porque o mesmo raciocínio que vale para a economia, vale para uma série de outras coisas. Então eu acho que não dá pra você inundar o ensino médio com um número enorme de disciplinas, o que vai fazer com que você deixe de aprofundar naquilo que tem que ser visto. Então quer dizer, os indicadores internacionais mostram que os resultados dos brasileiros são muito fracos. Português, matemática, ciências são disciplinas básicas. O que eu acho que poderia acontecer, por exemplo, num curso de matemática do ensino médio, são que problemas econômicos deveriam fazer parte do roteiro dos professores. Então quer dizer, seria uma forma de eles aprenderem matemática através de problemas do mundo real que despertariam maior interesse dos alunos do que com problemas abstratos que às vezes eles nem conseguem enxergar a aplicação. Acho que essa solução seria muito mais adequada do que você criar uma disciplina, porque nós já vimos aí recentemente a tentativa de criar filosofia, de criar espanhol, de criar não sei o quê, depois você não tem professor pra dar [aula], isso redunda numa diminuição da carga horária das matérias chamadas básicas. O que eles não aprendem de matemática vai fazer falta depois quando entram na faculdade, então acaba invertendo os papéis.

E – Então essa falta de preparo das pessoas mais jovens e da sociedade como um todo atualmente, a gente pode dizer que é por conta disso, que por essa falta de conhecimento e busca pelas informações sobre economia, que estão dessa forma os índices de inadimplência, endividamento. São reflexos dessa falta de educação?

L.A – Eu acho que aí nós estamos misturando coisas diferentes. Eu acho que no caso da inadimplência, o endividamento deve-se à explosão do crédito que se deu no Brasil depois de muito tempo. Você teve um crédito represado e depois de muitas décadas você teve uma liberação muito grande do crédito, um estímulo muito grande ao crédito, que é uma forma, inclusive, que o governo encontrou para que o Brasil não fosse tão afetado pela crise. Então eu acho que são coisas diferentes. Não é um problema de despreparo.

E – Então não tem a ver com a compreensão de economia essas pessoas comprarem impulsivamente diante de uma abertura de crédito?

L.A – Eu acho que depois de o Brasil ter muitos anos de inflação, em que você tinha ilusões de rentabilidade, você tinha orçamentos fictícios, você tinha ganhos financeiros maiores que ganhos operacionais, quer dizer, aquela inflação maluca que nós tínhamos tirou o país do eixo. Isso mexe totalmente com a estrutura da sociedade. Não é só com a economia. Isso mexe com os princípios individuais, isso derruba o caráter da solidariedade, cada um pensa no próprio umbigo, todo mundo pensando no dia seguinte, só se pensa no curto prazo. E foram mais de duas décadas assim. Então isso gerou uma cultura inflacionária e aquela geração foi muito marcada por isso. Depois você teve a estabilidade. Com a estabilidade veio um período de, necessariamente, aperto de cinto, enfim, uma política monetária rígida. Então você teve uma inserção muito grande de gente que vivia marginalizada e entrou na economia e essas pessoas puderam, pelo menos, ter acesso a coisas básicas que eu não sei como elas faziam antes. Passado algum tempo, uns dez anos, o Brasil entrou numa fase em que ele alterna alguns crescimentos altos com alguns períodos de estagnação. Então isso gera uma certa incerteza. A sorte é que o emprego e a renda tem sido mantidos em alta, então isso neutraliza um pouco a percepção negativa das pessoas. Agora, justamente pra manter isso é que você teve aí duas coisas que foram favoráveis. Uma é que o Brasil pegou carona no bom desempenho do mundo até 2008/2009. Então isso mais o crédito elevado fizeram com que muita gente saísse desesperadamente às compras e quem não mudou esse comportamento quando a conjuntura mudou, está enfrentando problemas.

E – Saindo agora dessa área histórica e da educação de economia no Brasil e olhando mais para o futuro e a própria profissão do economista: como você avalia hoje o preparo das escolas de economia diante das necessidades do Brasil com essas transformações econômicas no mundo e especificamente com os eventos esportivos que o Brasil vai trazer nos próximos anos, a Copa, as Olimpíadas?

L.A – Eu acho que o curso de economia é muito adequado para o período que nós vivemos e para a exigência do mercado profissional, do mercado de trabalho. É um curso abrangente, é um curso que combina uma visão teórica muito forte, uma visão histórica e com formação e métodos quantitativos, o que dá ao economista uma flexibilidade muito grande, uma capacidade de adaptação muito grande. O economista tem a possibilidade de atuar em várias ocupações. Aliás, um dos resultados do último Censo é justamente esse: o economista, o administrador e outras profissões que exigem muito na formação, o engenheiro, sobretudo o engenheiro de produção, eles têm depois uma capacidade de ocupar vários campos de trabalho, ao contrário, por exemplo, de um veterinário, de um dentista, que têm opções muito restritas. Então eu acho que isso é um dado muito positivo. Agora, você tem um preço a pagar. Não é um curso fácil. É um curso que exige muito e é por isso que vejo que muito estudante foge do curso de economia. Mas aqueles que seguem, que fazem economia e fazem bons cursos, este seguramente tem um futuro muito bom pela frente.

E – Então diante disso como é que você vê o perfil daqueles estudantes que estão entrando e principalmente aqueles que estão saindo do curso de economia hoje em dia?

L.A – É isso que eu te falei. Claro que eu reconheço que nem todos os cursos de economia têm a mesma qualidade. Mas aqueles que se formam em cursos bons, estão se formando muito bem e estão tendo muitas oportunidades. O mercado, hoje, atrai economistas como há muito tempo não atraía. E não é só economista. Engenheiro vive a mesma situação, um bom gestor vive a mesma situação, ou seja, o fato de a economia estar pelo menos estabilizada com um nível de emprego em alta, com os eventos internacionais que o Brasil vai fazer, com o processo de internacionalização da economia brasileira, com a atração que o Brasil exerce ainda com investidores estrangeiros, tudo isso torna o cenário muito favorável pra quem está se formando e o que se espera é que isso inspire mais gente a fazer economia, estimule mais gente a fazer o curso de economia.

E – Você acha que o Brasil está sabendo aproveitar, do ponto de vista econômico, esse desenvolvimento que esperamos com os eventos que estão vindo para o Brasil, com essas transformações econômicas e com a realidade do Brasil diante do mundo?

L.A – Lamentavelmente, não. Eu acho que falta muita coisa. Eu acho que estruturalmente o país tem problemas, a máquina está montada de uma forma que não favorece. É um absurdo pra mim o Brasil ter 37 Ministérios. Isso torna o custo da máquina extremamente alto, exige um nível de arrecadação que torna o Brasil um país muito caro, então hoje nós estamos perdendo oportunidades. O resultado que saiu, por exemplo, do turismo explica bem isso. Os brasileiros gastaram US$ 22 bilhões no exterior e os estrangeiros gastaram US$ 6 bilhões no Brasil [em 2012]. Por que? É muito caro viajar para o Brasil. Eu acho que isso não é culpa nem de crise internacional, nem de exploração de A, B ou C. Isso é um problema nosso, é falta de fazer lição de casa. O custo Brasil é um custo hoje assustador. E não só para o estrangeiro. É um custo que torna os nossos produtos pouco competitivos, torna o custo de vida no Brasil muito alto, então eu acho que o Brasil deveria ter um custeio muito mais baixo, liberando recursos para investimentos, sobretudo na infraestrutura porque nós sabemos que, o meu medo da Copa, Olimpíada, não é com os estádios. Os estádios vão ficar prontos, de um jeito ou de outro eles vão ficar prontos. Meu medo maior é com relação à infraestrutura. É uma vergonha o que acontece no Brasil ainda.

E – A questão de transportes e aeroportos, tudo o mais, não?

L.A – Sobretudo o transporte. Mas mesmo hospedagem. Não é que nós não tenhamos hotéis, mas é que hoje os preços dos hotéis no Brasil equiparam-se aos hotéis mais caros do mundo. Em algumas cidades é muito difícil o cidadão, hoje, fazer turismo, ou mesmo viajar a trabalho. É muito caro hoje. Eu tenho um dado: até algum tempo atrás os alunos brasileiros que queriam fazer intercâmbio pensavam duas, três vezes porque tinham dificuldades de se manter lá fora. Hoje é o contrário. Hoje a dificuldade é trazer estudante estrangeiro para o Brasil porque o custo de viver no Brasil é muito alto comparado com o que eles têm para viver nos seus respectivos países. Então isso pra mim é um custo interno que nós não estamos enfrentando, não estamos tendo a coragem de enfrentar. Isso vale para todos os níveis porque, no fundo, não é só o governo federal que tem culpa, não. Você tem Estado que mantém um número de secretarias absurdo, uma máquina gigantesca para custear e quem acaba pagando o preço disso é a população comum, é o consumidor, é o contribuinte.

Abaixo, confira um podcast com as ideias principais discutidas na entrevista.

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