Toda vez que fecha-se a balança comercial com lucro a idéia é que com certeza haverá ou houve desenvolvimento econômico. E quando pensamos em “desenvolvimento econômico”, seguimos a idéia na qual Celso Furtado constrói sua crítica, “a idéia de que os povos pobres podem algum dia desfrutar das formas de vida dos atuais povos ricos”. Esta semana estive lendo o relatório do Ministério de Desenvolvimento do Brasil, referente a balança comercial de exportações e importações dos municípios brasileiros, que me fez lembrar imediatamente de outro Relatório do Índice de Desenvolvimento Municipal, elaborado pela FIRJAN, divulgado em julho deste ano. Uma breve análise dos dois é suficiente para provar que entrada de dinheiro não necessariamente implica em desenvolvimento sócio-econômico. Confirmando Celso Furtado, “o aumento relativo de privilegiados…não impede, entretanto, que se mantenha e aprofunde o fosso que entre eles e a grande maioria da população…”.

Divulgado recentemente, o primeiro relatório mostra que “… 2.259 cidades brasileiras operaram no comércio exterior. De janeiro a setembro, as exportações brasileiras somaram US$ 150,868 bilhões e as importações US$ 131,212 bilhões, desempenhos que resultaram num superávit comercial (diferença entre o valor exportado e o importado) de US$ 19,656 bilhões.” De início, podemos nos surpreender com tal número, pois afinal de contas ele mostra que quase a metade do número total de municípios emancipados do país estão exportando desde matérias primas a bens de consumo, e olhando para o resultado de superávit relacionamos o lucro com desenvolvimento em tais regiões. Porém, em breve análise, perceberemos o contraste entre as regiões e a predominância da centralização e concentração de um pólo exportador.

Dentre as dez primeiras cidades que tiveram um maior fluxo de exportações no período de janeiro a setembro, encontramos quatro do estado de São Paulo, três do Rio de Janeiro, uma de Minas Gerais, uma do Pará e uma do Paraná, trazendo a tona mais uma vez a disparidade do crescimento econômico do Brasil,entre o fortíssimo eixo sudeste-sul e a debilidade de outras regiões, construindo o seguinte ranking:

1- São Paulo/SP – US$6,416 bilhões
2- São José dos Campos/SP – US$5,085 bilhões
3- Angra dos Reis/RJ – US$4,489 bilhões
4- São Bernardo do Campo/SP – US$3,392 bilhões
5- Paranaguá/PR – US$3,278 bilhões
6- Santos/SP – US$3,223 bilhões
7- Macaé/RJ – US$2,991 bilhões
8- Itabira/MG – US$2,422 bilhões
9- Parauapebas/PA – US$2,648 bilhões
10- Rio de Janeiro/RJ – US$2,530 bilhões

Paralelamente a estes dados podemos visualizar o segundo relatório, onde foi divulgado o índice de desenvolvimento municipal, que considera com igual ponderação três áreas de desenvolvimento humano – Emprego e Renda, Educação, Saúde. A pesquisa é realizada com um recorte municipal com alcance de todo o país. Sendo que o resultado final ficou resumido da seguinte maneira: “Considerando o grupo dos 100 primeiros colocados, 87 municípios estão no Estado de São Paulo. Os 13 restantes dividem-se entre Paraná (Maringá, Londrina e Curitiba), Santa Catarina (Brusque, Videira e Jaraguá do Sul), Rio de Janeiro (Macaé e Niterói), Rio Grande do Sul (Marau e Lajeado), Goiás (Catalão), Espírito Santo (Vitória) e Minas Gerais (Nova Lima).” Neste ponto, fazemos uma breve comparação entre o registro dos dez primeiros de um com os 100 primeiros de outro, pois se alinhássemos apenas os dez primeiros de cada ranking não seria possível uma visualização abrangente. Afinal de contas, no que tange a desenvolvimento municipal, o estado de São Paulo predomina nas 33 primeiras posições.

Na verdade, sabemos muito bem, que esta desigualdade na construção do desenvolvimento econômico brasileiro, a desigualdade entre regiões e a concentração de pólos econômicos não são frutos de acontecimentos recentes . Desde pós-segunda guerra mundial alinhado ao processo de industrialização vivido pelo país, o Brasil entrou em um processo de urbanização e desenvolvimento de pontos estratégicos em seu território. Resultando aglomerações espaciais e concentrações econômicas, fenômeno chamado por muitos de metropolização, que gerou nada mais nada menos do que o que os relatórios acima citados identificam em suas análises.

Este fantasma, de centralização, disparidades regionais, entrada de fluxos financeiros elevados porém baixas taxas de desenvolvimentos locais, nos assombra até hoje, afinal de contas, Angra dos Reis com um total de US$4,489 bilhões, Paranaguá com US$3,278 bilhões, Parauapebas com US$2,648 bilhões, ocupam respectivamente a 427º, 820º, 2154º posição no ranking de desenvolvimento municipal. Este breve olhar, só nos leva concluir que uma plataforma de lucro e superávit não está diretamente ligada a avanço econômico social do local. Infelizmente ainda não aprendemos com nossa construção histórica e permanecemos agindo da mesma maneira. Faz-se necessário a implantação de uma proposta de desenvolvimento conectada com a realidade de todo o país, não apenas com as regiões mais lucrativas e principalmente contextualizada com as novas questões que se abrem neste início de século. Quem sabe, uma proposta de “identificação das necessidades fundamentais da coletividade e das possibilidades que abre ao homem o avanço da ciência”.

• Trechos do livro O Mito do Desenvolvimento Econômico – Celso Furtado – 5ªEdição

João Baptista
Email: joao@3cnetwork.org
Blog: www.concepcoeseconjunturas.blogspot.com

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