Manuel Fernandes e Steve Rimmer*

Exploração de fontes não convencionais no Brasil
“É preciso observar as decisões a serem tomadas nos próximos anos, para se dimensionar com mais precisão como e em que grau será prospectado o shale gas no Brasil. Além das consequências geopolíticas, questões como impostos, regulação e mão de obra também devem ser levadas em conta”. Na foto, extração de petróleo, que continua sendo o principal combustível produzido no país. Foto: Divulgação Petrobras.

Em uma época em que muito se comenta sobre pré-sal e royalties do petróleo, surge em cena um novo e promissor elemento que pode ser usado como matéria-prima para a indústria de óleo e gás. Cada vez mais presente nos debates sobre matriz energética nos últimos anos no Brasil, o gás de folhelho, popularmente conhecido como gás de xisto (shale gas, em inglês), vem ganhando relevância a cada dia, embora seu potencial produtivo e possíveis riscos ao meio ambiente ainda estejam em discussão. Mesmo não sendo possível afirmar com exatidão qual o volume de suas reservas, acredita-se que o país tenha chances de se tornar um importante produtor desse tipo de gás não convencional, ficando entre os dez maiores.

Com o potencial de trilhões de metros cúbicos de shale gas espalhados em bacias ao redor do planeta, sua vantagem econômica é permitir a exploração e produção de um insumo a partir de fontes não convencionais contribuindo para o fornecimento de gás natural. Por ser mais barata do que o petróleo, a extração do gás não convencional poderá acarretar uma mudança profunda na matriz energética no mundo todo. Temos como exemplo os Estados Unidos, onde a extração e produção do shale oil and gas estão avançadas. Neste caso, o aumento da oferta do gás provocou uma redução nos preços, forçando outras nações a seguirem o mesmo caminho para evitar que suas indústrias percam a competitividade. Especialistas mais otimistas preveem que os norte-americanos poderão tornar-se autossuficientes em óleo e gás em poucos anos. Pelo mesmo caminho, segue o Canadá que já usa esse insumo de forma comercial e que oferece aos investidores alguns incentivos fiscais.

Na América Latina, a Argentina também está investindo nessa área e o Brasil ainda está engatinhando e despertando para o assunto. No mês de novembro, o governo realizou a 12ª rodada de licitação quando foram arrecadados, aproximadamente, R$ 165,2 milhões com bônus de assinatura e arrematados 72 dos 240 blocos ofertados. E desses, quase 70% ficaram com a Petrobras. De acordo com a Agência Nacional de Petróleo (ANP), apenas três das sete bacias dos blocos ofertados têm vocação para apresentar recursos não convencionais, conforme estudos geológicos e sísmicos: do Recôncavo (Bahia), Sergipe-Alagoas e São Francisco (Minas Gerais). No total, 12 empresas apresentaram ofertas vencedoras, sendo oito brasileiras e quatro estrangeiras.

Um fato interessante é que o leilão atraiu também companhias de energia elétrica de olho nesse insumo. Uma vantagem seria a sua utilização na geração de energia nas usinas térmicas que têm hoje uma participação relevante na matriz energética brasileira. Em busca do aumento da independência energética e de uma alternativa para geração térmica por meio do gás natural, a construção de térmicas apareceu como uma oportunidade de negócios.

Apesar de todo esse potencial, os investidores não mostraram muita euforia nesse leilão, principalmente, por causa do alto nível de risco exploratório e dilemas ambientais, dentre eles, questões que envolvem a falta de infraestrutura e logística nas regiões onde se localizam os blocos, incluindo a ausência de rede de gasodutos, o que pode encarecer o investimento, aumentar o risco e reduzir a rentabilidade. Motivos pelos quais não se pode prever ou estimar o preço final do produto, visto que ainda não sabemos qual será o custo de produção.

Se, de um lado, acredita-se que o shale oil and gas represente uma alternativa energética, por outro, cresce a preocupação ambiental em função do pouco conhecimento geológico das bacias e os riscos ambientais. Com isso, o debate sobre a utilização dessa fonte de energia jamais explorada começa a tomar corpo, e um dos pontos controversos diz respeito à forma de extração. Só para esclarecer, a retirada é feita por um sistema de fraturamento hidráulico, já que o produto é encontrado em camadas profundas, diferentemente do gás convencional que pode ser extraído facilmente. Trata-se de um método de perfuração do subsolo que utiliza uma mistura de água, areia e produtos químicos para atingir as camadas de xisto e extrair gás natural dos poros das rochas. É justamente esse ponto que não agrada os ambientalistas em todo o mundo, por causa do risco de contaminação dos lençóis freáticos.

Diante desses questionamentos, é preciso observar as decisões a serem tomadas nos próximos anos, para se dimensionar com mais precisão como e em que grau será prospectado o shale gas no Brasil. Além das consequências geopolíticas, questões como impostos, regulação e mão de obra também devem ser levadas em conta. Mesmo sabendo que os fatores que criaram um ambiente favorável à exploração nos Estados Unidos não serão os mesmos em outros países e, se de fato, superarmos os obstáculos da exploração, o cenário do mercado mundial de energia será alterado radicalmente. Esse é o momento para estudarmos a viabilidade do negócio e buscarmos respostas mais precisas sobre o potencial brasileiro. Ao certo, o que sabemos é que não dá para desconsiderar essa alternativa dentro de uma matriz energética complexa como a nossa. Apesar dos pós e contras, não podemos deixar de destacar a importância do leilão do shale gas que já foi realizado e que pode ser considerado o primeiro passo para o desenvolvimento de uma gigante indústria de exploração e produção de gás não convencional no Brasil.

* Manuel Fernandes e Steve Rimmer são sócios da KPMG no Brasil.

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