Veja essa incrível sequência:

“O problema é lá, não aqui” (ministro Guido Mantega, em 15 de setembro, dia um pós-quebra do banco americano Lehman Brothers, estopim da fase aguda da crise global).

“Ela [crise] pode atingir, mas atingirá o Brasil menos do que em qualquer outro momento. Eu diria muito menor [do que na década de 1990], quase imperceptível” (presidente Lula, em 17 de setembro).

“Ela [crise] é lá [EUA] um tsunami, e aqui vai chegar uma marolinha, que não vai dar nem para esquiar” (Lula, 5 de outubro).

“Nós vamos ter alguns problemas momentâneos, mas temos robustez suficiente para superar essa imensa fase de contágio com uma pequenininha gripe” (ministra Dilma Roussef, 5 de outubro).

“A pior fase passou” (Dilma, 21 de novembro).

Pode-se compreender que, numa crise, dirigentes tentem acalmar dirigidos e manter a confiança de empresários e consumidores. É preciso conceder também que essa veloz e furiosa crise global é especialmente difícil de prever.

Mas impressiona a veemência e a insistência com que o governo menosprezou a crise ao longo do último trimestre de 2008, justamente quando nossa economia, agora sabemos, encolheu com intensidade superior à da maioria dos outros países, até porque ainda vínhamos num crescimento de alta octanagem.

A cúpula do governo, no papel de animadores de plateia, exagerou no otimismo ou, pior, entendeu tudo errado?

O cavalo de pau econômico deixou o governo atordoado. Empresários que estiveram reunidos com a equipe econômica na semana passada relatam sensação de falta de rumo.

Antes da crise estava fácil governar o Brasil, relativamente ajustado 15 anos após o Plano Real. A eleição de Lula e suas sábias escolhas selaram um construtivo consenso nacional em torno da estabilidade econômica, destravando o potencial brasileiro.

Isso e o exuberante estado da economia global geraram um ciclo virtuoso de crescimento no país, com nove trimestres seguidos de alta nos investimentos e 21 no consumo das famílias.

Nesse período de abundância, também alavancado, é preciso reconhecer, pelos excessos financeiros que agora atacamos, os erros cometidos por nossos dirigentes eram relativamente diluídos no ciclo mais virtuoso de nossa economia.

Não mais. Os erros custam cada vez mais caros.

Os aumentos expressivos dados no ano passado por Lula e Congresso ao funcionalismo público, por exemplo, pareciam erro menor num quadro de arrecadação tributária em disparada. No quadro atual, é um erro hediondo, que reduz a capacidade de ação anticrise do governo.

E nesta era de incertezas, onde líderes do liberalismo como EUA e Reino Unido lideram o intervencionismo estatal, o papel dos governos tornou-se essencial. São a única saída.

Mas o desempenho do nosso governo desde setembro deixa a desejar. Na retórica e também na ação.

As obras de infraestrutura do PAC andam como tartaruga, apesar das verbas disponíveis, travadas por incompetência e restrições legais, ambientais e, agora, de crédito.

O pacote habitacional, além de demorar, ganha assustadores contornos eleitoreiros, com Dilma anunciando o programa prestação zero aos mutuários de baixíssima renda em plena escalada de candidata.

Se nos tempos de bonança, quando são possíveis, o governo tivesse feito reformas estruturais que reduzissem a carga tributária, a burocracia e o custo do emprego, os empresários teriam mais apetite.

Mas Lula, como seus predecessores, acomodou-se nas facilidades.

Agora, na dificuldade, é correr atrás do prejuízo.

Sérgio Malbergier é editor do caderno Dinheiro da Folha de S. Paulo. Foi editor do caderno Mundo (2000-2004), correspondente em Londres (1994) e enviado especial a países como Iraque, Israel e Venezuela, entre outros. Dirigiu dois curta-metragens, “A Árvore” (1986) e “Carô no Inferno” (1987). Escreve para a Folha Online às quintas.
E-mail: smalberg@uol.com.br

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